Cozinha Mineira

Feijão Tropeiro Livro Dona Lucinha - Cozinha Mineira

Hoje a matéria aqui é sobre Cozinha Mineira. É, vamos falar um pouco dessa culinária tão rica e saborosa que sempre nos deixa com água na boca.

E, se é pra falar de Cozinha Mineira, nada melhor do que dar a palavra a uma autêntica representante; que palestra e faz jantares mundo afora, levando um pouco de Minas e do Brasil para os mais diversos países como Itália, França, Estados Unidos e Finlândia. Estou falando de Elzinha Nunes, a chef que hoje comanda os restaurantes Dona Lucinha e Aneto.

Elzinha continua o trabalho de sua mãe Dona Lucinha, uma grande mestra da Cozinha Mineira, que há mais de 20 anos abriu o restaurante que leva seu nome e fez fama nacional. Reconhecimento que ficou registrado no seu livro “História da Arte da Cozinha Mineira por Dona Lucinha” da editora Larousse (a foto de Feijão Tropeiro do livro abre a matéria).

Então agora Fala Chef! Com a palavra Elzinha Nunes e alguns segredos da Cozinha Mineira.

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Elzinha Nunes - Cozinha MineiraChef Elzinha Nunes preparando linguiças artesanais que serve no restaurante Dona Lucinha (à venda também no Empório da casa)

Temos que tirar as mágoas das carnes

Ah …..o que seria da cozinha mineira sem as carnes?

Por Elzinha Nunes 

“Diz-se, com efeito, que a cultura de um povo se conhece pela sua culinária. E se tal assertiva mostra-se no geral verdadeira, especialmente quando se fala dos mineiros, de seu trivial culinário, do jeito de picar e refogar os ingredientes disponíveis, de seus “sonhos aquecidos pelo fogão de lenha e goles de café ralo”.

Se, por um lado, as mineirices e mineiridades da culinária de Minas se forjaram nos caminhos e descaminhos da sua história, por outro lado, a história de Minas e o caráter de seu povo foram formados, em grande parte, na luta pela alimentação e sobrevivência. A carência de recursos alimentares do período colonial foi a condição não só para o surgimento do caráter cauteloso, econômico, do mineiro, mas também para o desenvolvimento de sua culinária criativa e inovadora.

Muito da história da Gastronomia de Minas Gerais, dividida basicamente entre a Cozinha da Fazenda (com mais molhos) e a Cozinha Tropeira (mais, digamos, seca, para ser transportada pelos longos caminhos dos tropeiros) está contada no excepcional – modéstia à parte – livro “História da Arte Mineira por Dona Lucinha”, escrito por minha mãe , Maria Lúcia Clementino Nunes (a Dona Lucinha) e por minha irmã, Márcia Clementino Nunes,  e recentemente reeditado e relançado pela Larousse. Neste breve artigo que escrevo não  cabem a história e inúmeras receitas, que trazem séculos e séculos de tradição. Por isso, decidi escolher um tema – a carne – para revelar um simples segredinho. E acreditem:  mineiro fala pouquinho e quando decide contar um segredo, pode anotar que é coisa valiosa…

Todo mundo sabe que mineiro adora pãozinho de queijo e angu. Mas poucos percebem a paixão que o povo de Minas tem – em todas as suas regiões – pela carne! Mineiro gosta de usar carnes de todos os tipos: com talos, grãos, brotos e folhas ou simplesmente pura.

A carne é para o mineiro essencial como o angu. Não pode ficar sem!

O segredinho, que conto aqui para todos, é o que torna as carnes ainda mais saborosas: por questões históricas e pelo folclore de minha região do Serro (Vale do Jequitinhonha), ao cozinhar temos que tirar as “mágoas das carnes”, como faziam as escravas.

Isso porque, diziam elas, o boi, ou qualquer animal, era abatido com o uso da força, porretes e machados, o que causava grande sofrimento ao animal. Com isto, as carnes ficavam muito duras e retinham o sangue perto dos ossos. Os ensinamentos das escravas mostraram que dar um banho de cachaça e limão antes, tornavam as carnes bem leves e sem gorduras ou maldades.

Taí parte dos segredos dos mineiros para tornar as carnes mais macias e suculentas.

Poxa, quando a gente começa, nem quer parar. Se existe espaço, vou contar mais um segredinho, que traz sabor e tem até rima:  “carne de mineiro, dorme no tempero!”

Além de tirar as mágoas, gostamos de, sempre, temperar de véspera e cozinhar muito lentamente…

Para terminar, sei que os jornalistas e intelectuais morrem de medo de produzir um  texto piegas. Mas não sou jornalista ou intelectual e, por isso, posso dizer o que sinto, sem meias palavras e medo de ser acusada de sensacionalista ou sentimentaloide. Por  isso digo que, apesar de tudo o que eu falei, o mais importante da cozinha mineira é simplesmente o que buscamos sempre preservar em nossos restaurantes de São Paulo e Belo Horizonte: é o jeitinho mineiro de ser no atendimento aos nossos clientes. Recebemos a todos com sorrisos, com um pãozinho de queijo na varanda, com uma cachacinha e com o torresmo que é sempre uma forma carinhosa do mineiro receber.

Como sempre diz a minha mãe, o primeiro ingrediente que colocarmos na panela é o Amor. Afinal, amor é o mais importante para estar com o corpo aberto para sentir as delícias do fogão e da vida e, claro, para eliminar qualquer mágoa e jogar para longe, bem longe, as maldades”.

 

 

Alessander Guerra

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