Para começo de conversa, qualquer restaurante teria que ter boa comida. O médico precisa fazer bem o seu trabalho, assim como o advogado, o engenheiro, o artista e todos os demais profissionais. Então, acho que, hoje em dia, um restaurante precisa muito mais do que boa comida, precisa estar conectado ao mundo e todas as suas demandas e responsabilidades.
Resolvi fazer esse post depois de visitar e bater um longo papo com o Benny Burattini Goldenberg, sócio do novo Mangiare Gastronomia, que fica no bairro da Vila Leopoldina (zona oeste de SP). Em outro post falo sobre os comes & bebes, ok?
Se tem ideias que podem contribuir ao tema, favor deixar nos comentários.
Arquitetura
A arquitetura não trouxe mármore da Itália, móveis da França, badulaques da Indonésia, lustre lapidado pelas freirinhas cegas de um convento nos Alpes, etc, etc, etc. O arquiteto não viajou na maionese, para chegar às cifras milionárias dos custos de vários restaurantes da atualidade. Aliás, tenho recebido muito email que começa falando da monumental obra do arquiteto para depois chegar ao chef, afinal comida em restaurante é só um detalhe, não é mesmo? O bom é o deslumbre!
Mas a arquitetura é importante, sim! Aliás, é fundamental! Não pelo deslumbre, mas porque um bom escritório de arquitetura não pode fazer um projeto sem pensar na sustentabilidade. E a sustentabilidade começa com o aproveitamento do imóvel.
No Mangiare Gastronomia a estrutura do imóvel (uma antiga oficina de tratores) foi totalmente reaproveitada: as paredes externas, telhado e madeiramento ficaram exatamente do jeito que eram. Os tijolos de paredes demolidas foram reutilizados na construção de novas. Os caixilhos de metal foram todos reaproveitados, nas paredes laterais formando enormes vidraças que dão diretamente para o jardim ou na estrutura do teto para criar uma iluminação zenital (a abertura no topo da cúpula, garante iluminação natural ao interior da construção). O resultado disso tudo: + iluminação natural e – consumo de energia. “Além disso, aproveitamos para desimpermeabilizar uma área de quase 300m2 na frente do imóvel, possibilitando que a água vá direto para o solo em dias de chuva” explicou Benny.
Todas as espécies utilizadas no paisagismo são da zona da Mata Atlântica e toda a irrigação é feita com reutilização de água da chuva, por meio de um tanque de decantação que recolhe a água das calhas.
Ok, o resultado foi um grande imóvel, com ótima iluminação natural, boa circulação de ar e uma área verde que dá uma sensação de tranquilidade e frescor ao ambiente.
Dia a Dia
- uso de jogo americano de papel craft para diminuir o impacto de uso de alvejantes na lavagem de toalhas. Papéis que depois vão para a reciclagem
- a área de lavagem possui torneiras especiais que diminuem a utilização de água
- aquecimento feito via energia solar
- estoques relativamente pequenos o que garante frescor e menor perda de produtos
- todas as torneiras dos banheiros são de válvulas para diminuir o consumo de água
- “quinzenalmente costumo me reunir pessoalmente com os funcionários para colocar um novo passo na cadeia de reciclagem (esta semana por exemplo, falamos sobre separação de lixo). É importante conscientizá-los” fala o proprietário do Mangiare Gastronomia
- os clientes recebem informações pelo jogo americano impresso com assuntos variados, nas paredes dos banheiros, no cardápio e até pelo atendimento dos garçons.
Projeto Água na Jarrra
É um jeito simples dos restaurantes se comprometerem com um mundo melhor, pela erradicação do uso de PET no estabelecimento. “Como nos comprometemos a enviar relatórios sazonais de consumo de água em jarra, isso forma um banco de dados bacana”, informa Benny
O projeto Água na Jarra é extremamente simples e fundamental. Pode ser adotado por empresas, restaurantes, bares, enfim qualquer estabelecimento que faça uso da água natural ou gaseificada. Acesse o link e saiba mais.
Slow Food
“Conheci o movimento na Italia e só depois fui entender que ele se estende no Brasil, entrei em contato com a Cenia Salles, um poço imenso de conhecimento em gastronomia sustentável e nacional. Atualmente trabalhamos com o umbu e o maracujá da caatinga.”
Sazonalidade e Apoio aos pequenos produtores
“A escolha da alcachofra como logo do nosso restaurante se deu justamente por acreditarmos que hoje em dia, o respeito à sazonalidade se perdeu. Não esperamos mais “a época” das frutas, legumes e verduras para poder consumí-las, uma das poucas exceções é a alcachofra, que ainda é celebrada em seu momento e aguardada o ano todo. Não somos um restaurante 100% sazonal, mas tentamos buscar o que há de mais fresco é em sua época que os produtos estão no seu auge de sabor!”
Acreditamos que o fomento de produtos e produtores nacionais é extremamente importante para fortalecer a economia nacional e fugir dos grandes fabricantes e fornecedores, até por uma certa “acomodação” nossa, optamos por buscar produtos mais conhecidos e fornecedores maiores, com uma cadeia de entrega mais bem formada, o que facilita, e muito, o dia a dia de um restaurante. Em relação aos ingredientes, tentamos SEMPRE priorizar os pequenos produtores e orgânicos.